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CÉU I-XXXIII

NUVENS 1967

ÂNGELA

primeiro andar à direita

[A3, 3]

NOITE 1968

Este espetáculo — como o que é totalmente novo se forma a partir daquilo que se passou — é o verdadeiro espetáculo dialético da moda. (…) Quando ele apresenta um novo leque como Leque de Íris, através do desenho de um arco-íris, quando a Via Láctea é apresentada como uma avenida noturna iluminada por candelabros a gás, quando a Lua Pintada por Ela Mesma repousa não sobre nuvens, mas sobre almofadas de pelúcia da última moda, só então se compreende que justamente neste século, o mais árido e menos imaginativo de todos, toda a energia onírica de uma sociedade se refugiou com dupla veemência no reino nebuloso, silencioso e impenetrável da moda, no qual o entendimento não a pode acompanhar. A moda é a precursora, não, é a eterna suplente do Surrealismo.

[B 1a, 2]

VIA LÁCTEA 1979

O pai do Surrealismo foi Dadá, a mãe foi uma passagem.

[C 1, 3]

PROJETO PARA A CONSTRUÇÃO DE UM CÉU 1981

Criança com sua mãe no panorama. O panorama representa uma batalha. A criança acha tudo muito bonito: “Pena que o céu esteja encoberto.” — “Assim fica o tempo na guerra”, retruca a mãe. • Diorama •

Portanto, os panoramas, no fundo, estão comprometidos com este mundo nebuloso; a luminosidade de suas imagens parece transpassá-los como cortinas de chuva.

[D 1, 1]

UM PARA (1:) 1982

A renúncia a efeitos pitorescos tem seu contraponto arquitetônico no abandono de toda a arte da perspectiva. Um sintoma muito significativo é a difusão súbita da silhueta…

[E 11, 1]

QUASARES 1983

Sons de uma harmonia nova
A flecha se elevava como um para-raios
Ela ia às nuvens
Procurar a força elétrica
A tempestade a enchia de vida e de tensão

[F 6, 1]

MOSQUITO 1983

O reclame é a astúcia com a qual o sonho se impõe à indústria.

[G 1, 1]

FONTES LUMINOSAS 1983

Ao final de Matéria e memória, o autor desenvolve a ideia de que a percepção é uma função do tempo. Poder-se-ia dizer que, se vivêssemos segundo um outro ritmo — mais serenos diante de certas coisas, mais rápidos diante de outras —, não existiria para nós nada “duradouro”, mas tudo se desenrolaria diante de nossos olhos, tudo viria de encontro a nós. Ora, é exatamente isso que se passa com o grande colecionador em relação às coisas. Elas vão de encontro a ele. Como ele as persegue e as encontra, e que tipo de modificação é provocada no conjunto das peças por uma nova peça que se acrescenta, tudo isto lhe mostra suas coisas em um fluxo contínuo.

[H 1a, 5]

CONSTELLATION 1984

O pintor deve… ser um bom dramaturgo, um bom figurinista e um hábil diretor… O público… interessa-se muito mais pelo assunto que pelo aspecto plástico.

[I 5, 1]

PÔR-DO-SOL 1984

O sol: “O sol turbulento tomando de assalto as vidraças da janela”; “As paisagens da grande cidade … esbofeteadas pelo sol” (A Arte Romântica).

[J 7, 2]

LUAR 1987

A cada formação verdadeiramente nova da natureza — e no fundo também a técnica é uma delas — correspondem “novas imagens”. Cada infância descobre estas novas imagens para incorporá-las ao patrimônio de imagens da humanidade. • Método •

[K 1a, 3]

ARCO 1988

Quando tiveram início as escavações?

[L 1, 1]

EXPANSIVO 1988

Rastro e aura. O rastro é a aparição de uma proximidade, por mais longínquo esteja aquilo que o deixou. A aura é a aparição de algo longínquo, por mais próximo esteja aquilo que a evoca. No rastro, apoderamo-nos da coisa; na aura, ela se apodera de nós.

[M 16a, 4]

SOL 1989

Não é que o passado lança sua luz sobre o presente ou que o presente lança sua luz sobre o passado; mas a imagem é aquilo em que o ocorrido encontra o agora num lampejo, formando uma constelação. Em outras palavras: a imagem é a dialética na imobilidade. Pois, enquanto a relação do presente com o passado é puramente temporal e contínua, a relação do ocorrido com o agora é dialética — não é uma progressão, e sim uma imagem, que salta. — Somente as imagens dialéticas são imagens autênticas (isto é: não-arcaicas), e o lugar onde as encontramos é a linguagem. • Despertar •

[N 2a, 3]

HÉLICES 1993

O jogo é o contraponto infernal da música dos exércitos celestiais.

[O 10a, 6]

BLACK BLUES 1993

Ali, numa nuvem de vapor de amoníaco… e em camas que não foram arrumadas desde a criação do mundo, repousam lado a lado centenas e milhares de saltimbancos, vendedores de fósforos, tocadores de acordeão, corcundas, cegos, mancos; anões e aleijados, homens com o nariz devorado em brigas, homens-borracha, palhaços envelhecidos, engolidores de espadas, malabaristas que equilibram um pau-de-sebo entre os dentes… Crianças de quatro pernas, gigantes bascos ou outros tipos, o Pequeno Polegar em sua vigésima encarnação, personagens vegetais cuja mão ou braço é o solo de uma árvore verdejante que rebrota a cada ano com toda a pujança de seus galhos e folhas; esqueletos vivos, homens transparentes feitos de luz…, cuja voz debilitada pode ser escutada com um ouvido atento…; orangotangos com inteligência humana; monstros que falam francês.

[P 4, 1]

ASA 1995

Gostaria de ser levado de novo aos dioramas cuja magia brutal e imensa sabe impor-me uma útil ilusão. Gosto sobretudo de contemplar alguns cenários de teatro onde encontro, artisticamente expressos e concentrados de forma trágica, meus sonhos mais caros. Essas coisas, porque falsas, estão infinitamente mais próximas da verdade.

[Q 4a, 4]

ARTEHARPIA 1995

A odalisca está deitada à espreita ao lado do tinteiro e sacerdotisas erguem taças nas quais depositamos pontas de cigarros como sacrifícios de fumaça.

[R 2, 3]

ALMA MINHA 1995

Infelizmente esses lugares maravilhosos que são as estações, de onde se parte para um destino longínquo, são também lugares trágicos, porque… é preciso deixar para trás qualquer esperança de voltar e deitar-se em casa, uma vez que se decidiu penetrar no antro empesteado por onde se chega ao mistério, numas dessas grandes oficinas envidraçadas, como a de Saint-Lazare, onde eu ia pegar o trem, e que desenrolava por cima da cidade dilacerada um desses imensos céus, nus e pesados com ameaças carregadas de drama, como alguns céus pintados com uma modernidade quase parisiense, de Mantegna ou de Veronesi, e sob o qual não podia se cumprir senão algum ato terrível e solene como a partida em uma estrada de ferro ou a elevação da Cruz.

[S 10a]

ESTANDARTE VERMELHO 1999

e à noite, iluminado por tochas

Medalha de 1667, recordando a introdução da iluminação das ruas.

[T 1, 1]

HINO À BANDEIRA 2002

Este hino de sangue, estas imprecações atrozes, testemunham não o perigo da pátria, mas a impotência da poesia liberal; poesia sem inspiração fora da guerra, da luta ou da lamentação… Ó povo! canta, entretanto, canta a Marselhesa, já que teus poetas permanecem mudos ou não sabem recitar senão uma pálida cópia do hino de teus país. Canta! a harmonia de teus acentos prolongará por algum tempo ainda a alegria com que o triunfo encheu tua alma; os dias de felicidade são para ti tão raros e tão curtos! Canta!… tua alegria é tão doce àqueles que simpatizam contigo! há tanto tempo eles não ouviam sair de tua boca senão lamentações, gemido e murmúrios!

[U 7, 3]

AURORA 2004

Urbanismo: Quem pretende ter um salão magnífico sabe muito bem que a beleza da peça principal não dispensa a ornamentação das avenidas. O que pensariam de seu belo salão se, para chegar até ele, fosse preciso atravessar um pátio obstruído por esterqueiras, uma escada atravancada com entulho, e um vestíbulo guarnecido de velhos móveis rústicos?… Como explicar, pois, que o bom senso que se encontra em cada indivíduo que orna uma residência particular não se encontre em nossos arquitetos, para ornar as moradas coletivas chamadas… cidades? E por que, entre tantos príncipes e artistas… nenhum jamais pensou na ornamentação graduada dos 3 acessórios: subúrbios, anexos e avenidas…?

[W 17, 3]

GLÓRIA 2005

Ponto de partida para uma crítica da cultura: A superação positiva da propriedade privada enquanto apropriação da vida humana é … a superação positiva de toda alienação — portanto, o retorno do homem da religião, da família, do Estado etc., para sua existência humana, isto é, social.

[X 1a, 4]

SUL 2006

Sol, tome cuidado!

Se o sol um dia se apagasse
Um mortal é que o reacenderia.

[Y 1, 1]

ILUMINURAS 2010

Lá onde se veem as horas nos olhos, e não no relógio.

[Z 1, 1]

LUZ DEL FUEGO 2012

Ó força, rainha das barricadas … tu que brilhas no relâmpago e na rebelião … é a ti que os prisioneiros estendem suas mãos acorrentadas.

[a 13, 4]

BLUES 2016

Essa passagem decisiva, que faz explodir o estado de consciência do século, em O que diz a Boca de sombra:

Chorai sobre a aranha imunda, sobre o verme,
Sobre a lesma de dorso molhado como o inverno,
Sobre o vil pulgão que se vê pendurado nas folhas,
Sobre o caranguejo medonho, sobre a horrenda centopeia,
Sobre o sapo assustador, pobre monstro de olhos doces,
Que olha sempre o céu misterioso!

[d 17a, 3]

RAIO 2016

No céu, um anjo de proporções reduzidas, planando sobre a terra e soprando uma trombeta. No instrumento está pregado um cartaz, onde se lê: À imortalidade.

[g 2a, 5]

RODA GIGANTE 2020

Sonho ingênuo por seus aspectos de exposição universal, mas que, de qualquer forma, implica profundas realidades, sobretudo a certeza de uma ordem unânime a ser fundada, a ordem criada pelos cidadãos.

[k 2a, 6]

CABEÇAS 2021

Se agora é permitido ler nos jardins públicos, é proibido fumar ali; a liberdade, como se começa a dizer, não é permissividade.

[l 1, 9]

VULCÃO 2021

Sobre o folhetim. Tratava-se, por assim dizer, de injetar na experiência, por via intravenosa, o veneno da sensação; isto quer dizer: ressaltar na experiência comum o caráter de vivência. A isto se prestava, em primeiro lugar, a experiência do habitante das grandes cidades. O folhetinista tira proveito disso. Ele torna a grande cidade estranha para seus habitantes. Dessa forma, ele é um dos primeiros técnicos convocados pela necessidade premente de vivências.

[m 3a, 2]

BOCA DO INFERNO 2022

A união dos sexos no futuro deverá ser o resultado de simpatias… profundamente estudadas…, mesmo que se reconheça a existência de relações íntimas, secretas e misteriosas entre duas almas. Tudo isso ainda poderá ruir por conta de uma última prova decisiva, mas necessária, indispensável: a PROVA da MATÉRIA pela MATÉRIA; o EXPERIMENTO da CARNE pela CARNE!!!… É que, muitas vezes, na soleira da alcova, uma chama devoradora já se apagou; é que, muitas vezes, para mais de uma grande paixão, os lençóis perfumados do leito se tornaram uma mortalha; é que, mais de uma…. ao ler estas linhas, já terá entrado, certa noite, no leito do himeneu, palpitante de desejos e emoções, e levantado pela manhã fria e gelada.

[p 2, 5]

CARBONO 2023

A menos que seja rico … ou que tenha um cérebro limitado … o trabalhador sente que o repouso proporcionado pela renda o esmaga. Mesmo que o céu esteja sem nuvens, a casa em que ele mora seja verdejante, perfumada pelas flores e repleta de alegria com o canto dos pássaros; seu espírito inativo permanece insensível aos encantos da solidão. Se, por acaso, seu ouvido surpreende algum ruído agudo vindo de uma manufatura distante, ou mesmo o estalar monótono do moinho de uma fábrica, logo sua fronte se ilumina; ele não escuta mais o canto melodioso dos pássaros; não sente mais o perfume delicado das flores; a espessa fumaça que escapa da alta chaminé da fábrica, o barulho retumbante que a bigorna envia aos seus ouvidos fazem-no estremecer de alegria, levando-o a lembrar-se dos belos dias de trabalho manual, motivado pela inspiração do cérebro.

[r 1a, 4]