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Menos lulismo, companheiros

Contraforma 1, Renata Pedrosa

Fomos lulistas em 2022, claro. O candidato do PT era a única figura capaz de derrotar Bolsonaro e garantir a democracia. Uma vez eleito, sua visita aos ianomâmi simbolizou lindamente o retorno de padrões humanos às ações do Executivo.

Como estamos agora? Não esbravejo muito com Lula em questões de política econômica, ou no que se refere a seus acordos com o Centrão. Aí, como sempre, sua margem de manobra é pequena, e as coisas só mudarão quando houver energia ou interesse na ampliação de movimentos e organizações de base. Sem isso, é o modelo de sempre.

O que mais me incomoda, entretanto, é a hegemonia do “lulismo”, enquanto narrativa e versão dos fatos, no pensamento progressista. Engolem-se coisas demais.

Veja-se, por exemplo, o triunfalismo em torno do voto de Dias Toffoli, no STF, anulando provas da Lava-Jato. Confirma-se que toda a operação de Moro e Dallagnol foi uma monumental perseguição política; a “república de Curitiba” foi uma aberração, e até hoje o sul do país parece magnetizado pela histeria daquela caça às bruxas.

Verdade. Mas não vou ao ponto de concluir que Lula, seu governo e seus aliados nunca se envolveram em corrupção.

Contraforma 2, Renata Pedrosa

Dizer que, com base nas irregularidades do processo, Lula é inocente equivale a estender esse atestado à Odebrecht, a Renan Calheiros e aos hoje bolsonaristas Ciro Nogueira e Valdemar da Costa Neto. Que dizer da prisão do “golpista” Eduardo Cunha, no contexto do mesmo lava-jatismo que hoje, sem dúvida, reconhecemos como a origem do golpismo 2.0, o de Bolsonaro?

Nada me convence, no famoso caso do apartamento do Guarujá, que havia “inocência” no fato de Lula visitar um triplex em companhia do presidente de uma empresa com negócios internacionais do tamanho de hidroelétricas faraônicas e barragens mesopotâmicas. Como é possível que estivesse agindo como um corretor de imóveis, jogando sobre Lula um “papo de vendedor”, como declarou o petista naquela época? Era mais papo de comprador, na minha opinião.

Uma terminologia iniciada naquele tempo, pelos pensadores petistas mais exaltados, faz-se mais e mais em voga. A ideia é que existe um “estamento jurídico”, cioso de seus privilégios, interessado em minar o progresso da esquerda. Esta seria a “explicação sociológica” para a sanha do STF em perseguir Lula e seus aliados.

Claro que juízes, advogados e promotores são uma categoria à parte no conjunto da sociedade. Têm seus códigos, seus preconceitos, seus interesses, e — para bem ou para mal—seus limites.

Com que moral, entretanto, podemos querer a prisão de Bolsonaro, e acompanhar as provas e delações no caso das joias, ou insistir nos crimes da turma toda na gestão da pandemia, se desprezamos com uma risadinha a atuação do STF?

Contraforma 3, Renata Pedrosa

Lula foi além, e colocou em dúvida a legitimidade dos tribunais internacionais de direitos humanos.

Haha, deve ser o “estamento jurídico” internacional “perseguindo” lideranças populares como Putin e seus asseclas do grupo Wagner. Wagner! O segundo nome na organização, Dmitry Utkin, morto junto com seu líder Yevgenyi Prigozhin naquele acidente de avião, ostentava uma tatuagem da SS no braço.

As considerações de Lula sobre o Tribunal Internacional de Haia (do qual, segundo ele, só participariam “bagrinhos” como França, Holanda, Suécia e Canadá) são imperdoáveis.

São instituições desse tipo — assim como os tribunais brasileiros — que podem punir golpistas, genocidas e torturadores; exatamente aqueles que, em nosso país, continuam impunes.

Ou será que preferimos alguma forma de “justiça popular”, sem provas, advogados de defesa e formalidades processuais? Formalidades que, agora, para fechar o círculo, eliminam a culpabilidade do próprio Lula…

Pouco importa. Lula diz bobagens, é a natureza dele; o problema é quando passamos a repeti-las.