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De Campos a Campos: uma homenagem genético-afetiva

Augusto e Raquel Campos

O espaço em que me encontro é certamente singular — o reconheço de antemão. Em meio ao mundo acadêmico e ao legado carregado pelo nome (leia-se Campos), dedico-me ao propósito de estudá-lo, vida-obra de avô/poeta: ad augusta per angusta.

No âmbito familiar, a hierarquia é clara: primeiro avô. Depois poeta. A mistura dos dois começa a se emaranhar a partir do momento em que o objeto de afeto vira tese: um academicismo que ele certamente não esperaria tão próximo de si. Entre um tio músico, um pai físico e um tio-avô Haroldo, há de se imaginar a pressão para uma genialidade osmótica, ao passo que uma trajetória antiacademicista, anticanônica, antitradicionalista, simplesmente anti, faz parte do legado campesino, do qual muito me orgulho.

Não é apenas o se colocar contra (não importa a quê): é o espaço ocupado à margem da margem que me interessa, aquele que se afasta do centro, não numa tentativa de ser pouco lido, mas numa resistência de não ser mitigado, mastigado pela geleia geral esfaceladora: o difícil papel de ser medula e osso. A rigidez concreta mal interpretada. A suposta ausência de sentimento, de emoção, de intuição.

Augusto e Raquel Campos

A construção textual da via-linguagem não deixa de lado a fruição poética: a forma-conteúdo revoluciona a poesia-lágrima de dantes e de pois. As sucessivas tentativas de resgatar e remodelar o “já feito” não são capazes, apesar do esforço, de destruir as possibilidades do novo, da margem: a cicatristeza infinitesimal poética persiste no finismundo: até a última viagem.

Uma poesia que emocione, portanto, não equivale a uma poesia que foque apenas no conteúdo e esqueça a forma, pois o conteúdo é a forma e é essa espécie de “revolução” poética que abre as possibilidades para novos rumos. A poesia concreta ou a poesia inventiva, em sua essência, pode, sim, causar fruição e emocionar, mesmo sem priorizar o “humano”. E, nesse ponto, não faz sentido pensar binariamente, ou excluir uma coisa da outra, visto que elas podem coexistir no mesmo ambiente poético. O que está em jogo no espaço literário e no gesto escritural vai além dessa dicotomia.

“Diálogo a um”, “diálogo a dois”, e, agora, diálogo a três: eu, a Angústia do Canto e o “eu mesmo, além do espelho”: aquele que se reconhece em mim, sanguineafetivamente, e que não sou eu; aquele que me fala, dentre poesias e imagens, sons e criações.

E a Angústia, Augusto, não a carregará sozinho. Há de compartilhá-la por entre os silêncios poéticos, os ex-tudos mudos, os vivas e as vaias.

Se o sol que renova, dia sol, também nos renovará, a sol dia, que renasçamos no

passente

presturo

futuado

de hoje e sempre.