1

Nota de falecimento1

Nota triste neste 1º de maio de 2020: faleceu Ruy Fausto, professor emérito do Departamento de Filosofia da USP, aos 85 anos, em Paris, França.

Ruy Fausto era formado em direito pela Faculdade do Largo São Francisco, curso que seguiu paralelamente a seus estudos de graduação em filosofia, quando a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL) — atual FFLCH — ainda era sediada na Rua Maria Antônia. Com o golpe militar, teve de deixar o Brasil e se exilar no Chile, onde foi professor da Universidade Católica de Santiago. Depois da queda de Allende, se refugiou na França, onde já fazia estágio de pesquisa. Defendeu dois doutorados em 1981, como exigia a legislação francesa da época, sob a orientação de Jean-Touissant Dessanti, e se tornou professor da Universidade de Paris VIII. Sua atuação acadêmica foi devotada principalmente à investigação exaustiva da dialética de Hegel e Marx. Em meados dos anos 1980, com a reabertura democrática, passou a voltar frequentemente ao Brasil, inclusive para ministrar cursos no Departamento de Filosofia. Em 1989, defendeu sua livre docência na Universidade de São Paulo. Escreveu vários livros e artigos dedicados à dialética e ao marxismo, entre os quais se destacam os volumes de Marx: Lógica e Política. Investigações para uma reconstituição do sentido da dialética.

Ruy Fausto não se considerava exclusivamente um professor universitário, mas também um intelectual preocupado com o debate público, principalmente com os rumos daquilo que imaginava ser uma esquerda democrática. Foi essa ideia que perseguiu com energia — muitas vezes polemicamente — nas inúmeras intervenções que fez em artigos e entrevistas, onde procurava articular o pensamento teórico com o momento político. Dessas suas reflexões se destacam os livros: A esquerda difícil: em torno do paradigma e do destino das revoluções no século XX e alguns outros temas (2007), Outro dia (2009) e Caminhos da esquerda: elementos para uma reconstrução (2017). Foi um dos editores da Revista Fevereiro e acabara de fundar a Revista Rosa.

Sempre generoso com os amigos e com os estudantes brasileiros bolsistas em Paris, Ruy Fausto tinha uma memória notável que fazia dele um admirável contador de casos. Era também grande piadista e, como observou seu amigo Bento Prado Júnior, um obcecado dotado de auto-ironia.

Foi também poeta bissexto, tendo publicado Os piores anos de nossas vidas: histórias,“suspiros poéticos e saudades” (2008), além de poemas dispersos em revistas.

Não havendo compensação para a perda, resta o consolo de que faleceu ao lado do piano. Ruy Fausto também era um craque no instrumento.